Considerado um dos materiais mais utilizados na atualidade, os materiais compósitos possuem características fundamentais para a indústria aeronáutica, construção civil, indústria automobilística e área médica.
No entanto, ainda é difícil saber o que fazer com os rejeitos de compósitos quando estes chegam ao final da sua vida útil.
De forma geral, este é um contaminante muito complicado para seu descarte, a ponto de exigir diversos procedimentos e tratamentos.
E foi para entender as possibilidades de reciclagem de compósitos que cientistas do Instituto Mauá de Tecnologia (IMT) estão desenvolvendo uma técnica baseada no uso de micro-ondas para reciclar o material e devolvê-lo à cadeia produtiva.
A ideia central e os resultados dessa ampla pesquisa foram apresentados por Guilherme Lebrão, professor de materiais do IMT, durante o Parque de Ideias da Plástico Brasil 2023.
Confira!
O que são materiais compósitos?
Cada vez mais utilizados em novos projetos e produtos, os materiais compósitos são materiais heterogêneos e multifásicos compostos por 2 materiais diferentes com propriedades que se complementam, orientadas pelo princípio da ação combinada.
Esse é um princípio que define as melhores combinações de materiais baseadas em uma escolha racional de dois materiais distintos para uma composição resultante.
Os materiais compósitos são compostos por 2 fases:
- Fase matriz;
- Fase dispersa (ou reforço).
A fase matriz é contínua, abriga a fase dispersa e geralmente é responsável por dar liga ao material.
Já a fase dispersa se responsabiliza pelas propriedades mecânicas do material em função de sua forma, tamanho, distribuição e orientação.
Vale mencionar que a adesão fibra/matriz é um fator de relativa importância, uma vez que o mesmo define a forma como o reforço se comportará quando solicitado na matriz.
Benefícios do uso de compósitos
Os compósitos usualmente são materiais que exibem qualidades melhores do que seus constituintes isolados, oferecendo qualidades que nenhum dos componentes possui.
Assim, quando dois materiais diferentes se combinam, algumas qualidades são naturalmente melhoradas, como: resistência, rigidez, resistência à corrosão, resistência ao desgaste, peso, durabilidade, comportamento dependente da temperatura, isolamento térmico, condutibilidade térmica, isolamento acústico, entre outras.
Como exemplo de uso, Lebrão citou o uso de compósitos na fabricação de aviões: “Quando utilizados em aviões, os compósitos são tão resistentes quanto o alumínio, mas apresentam a vantagem de ser mais leve e rígido”.
No entanto, mesmo diante das muitas vantagens e do significativo crescimento da sua demanda, é preciso começar a pensar no correto descarte deste tipo de material. E, segundo Lebrão, essa é a grande proposta do IMT:
“Precisávamos achar uma solução para o fim da vida destes elementos que fosse além da reciclagem química e da reciclagem mecânica”, disse o cientista em sua palestra.
Daí, surgiu a possibilidade de adotar micro-ondas para reciclar compósitos de forma eficiente e segura.
Entendendo a pesquisa realizada pelo IMT
Focados na busca por uma possibilidade de reciclagem dos materiais compósitos, os pesquisadores utilizaram a resina de poliéster ortoftálica.
Este é um material que possui características termofixas com alta complexidade de reciclagem, como explicou Guilherme Lebrão.
“Poliésteres termoplásticos são materiais que podem ser derretidos e reprocessados. Porém, o material termofixo (caso do poliéster usado no nosso estudo) tem por característica o seu não derretimento, exigindo outro método de reciclagem.”
Lebrão disse, então, que a ideia dos cientistas foi adotar alguma técnica para despolimerizar este poliéster, ou seja, quebrar sua estrutura, devolvendo o éster ou outra solução que seja passível de ser usada na produção de outro produto.
“Logo imaginamos que as micro-ondas poderiam fazer isso”, indicou Lebrão.
Os pesquisadores do IMT pensaram em tirar a resina da fibra através da pirólise, usando para isso as micro-ondas.
De uma maneira bem simplista, a pirólise é um processo de queima sem a presença de oxigênio. Assim, em um ambiente com nitrogênio ou gás nobre, este processo consegue quebrar as ligações do poliéster, produzindo subprodutos.
E foi exatamente isso que os cientistas do IMT fizeram. O resultado, segundo Lebrão, foi surpreendente: “Através das micro-ondas conseguimos retirar todas as fibras intactas. Já toda a resina foi evaporada!”, comemorou o cientista.
A fibra pode ser reaproveitada?
Em um segundo momento do estudo, Guilherme Lebrão explicou que além da evaporação da resina, a técnica de micro-ondas retirou alguma outra coisa a mais.
“Identificamos isso ao criar um novo compósito com a fibra reciclada e perceber que suas propriedades não eram as mesmas, faltava algo”, explicou o professor.
Depois de algumas análises, os pesquisadores identificaram que juntamente com a resina, o processo de micro-ondas retirou também uma espécie de adesivo, conhecido como “sizing”, sobrando apenas a fibra.
A solução, neste caso, é a de retratar a fibra para que ela volte a ter as suas propriedades finais.
Independentemente dessa pequena dificuldade, o uso das micro-ondas foi um grande passo para separar as fibras da resina, permitindo a reciclagem.
O mais interessante nessa técnica e que chamou bastante a atenção dos cientistas do IMT é o tempo. “Em apenas 5 minutos, sob uma determinada potência, conseguimos realizar o processamento da resina”, comemorou Lebrão.
Ele também ressaltou que o polímero evapora principalmente na forma de estireno, benzeno e tolueno, que são precursores químicos de várias substâncias industriais e, portanto, podem ser reutilizados.
Por fim, em sua palestra, Lebrão explicou que os cientistas do IMT estão realizando estudos que vão indicar a viabilidade do processo de micro-ondas na reciclagem de compósitos em larga escala.
“O processo demanda uma energia muito maior para acontecer, portanto ainda não é rentável. Mas quando consideramos o tempo para a sua realização, entendemos que o potencial é muito grande.”
Dessa forma, o professor concluiu que o processo de micro-ondas na reciclagem de materiais compósitos é sim eficiente, mas ainda depende de mais desenvolvimento para que ele seja mais viável economicamente.
Para saber mais sobre o estudo dos cientistas do IMT, confira a palestra de Guilherme Lebrão realizada durante a Plástico Brasil 2023!